MACAPÁ (AP) – Por Dom Pedro José Conti
Reflexão para o 12º domingo do Tempo Comum| 23 de Junho de 2024 – Ano “B”
A Coragem estava sendo perseguida pelo Medo. Procurou abrigo para passar a noite. Bateu à porta da Covardia, porém ela não lhe abriu e disse que não a conhecia. Bateu à porta da Mentira, que também não lhe atendeu alegando não estar em casa. Bateu, enfim, à porta da Preguiça, e ela se justificou: “Já estou deitada”. Então, a Coragem tomou coragem. Bateu à porta da Vontade e essa logo a abriu convidando-a para entrar. Quando amanheceu, as duas saíram de casa e o Medo vendo a Coragem e a Vontade juntas, fugiu.
:: Acesse aqui mais artigos de dom Pedro Conti
Continuando na sua “catequese”, o evangelho de Marcos do 12º Domingo do Tempo Comum, apresenta-nos mais uma pergunta sobre a identidade de Jesus. “Quem é este homem, a quem até o vento e o mar obedecem?” assim os discípulos “diziam uns aos outros”, depois que Jesus acalmou a tempestade durante a travessia do Mar da Galileia. Podemos ficar encantados com o poder de Jesus, mas é mais do que evidente que o evangelista quer nos conduzir muito mais longe que, simplesmente, nos contar um fato extraordinário ou milagroso. O objetivo do anúncio evangélico é sempre fazer-nos crescer na fé e na confiança em Jesus. Com efeito, é ele mesmo que questiona os discípulos: “Por que sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?”.
O medo dos discípulos é devido ao vento muito forte e às ondas que começavam a encher o barco. No entanto, Jesus parece não ligar para isso; ele dorme “sobre um travesseiro”. A quem apelar? Foi o Mestre que ordenou ir para “a outra margem”. Os discípulos, então, decidem acordá-lo com um grito de socorro: “Estamos perecendo e tu não te importas?”. Pelas palavras deles e de Jesus entendemos que há algo mais em jogo que aquele momento de tempestade e de medo. Naquele barco está o Mestre e a sua nova e pequena comunidade; eles são os seus primeiros seguidores. O evangelho, porém, foi escrito sobretudo para aqueles que virão depois, preparando-se para seguir Jesus – os catecúmenos – ou os já batizados e, portanto, todos os cristãos. A ordem de ir “para a outra margem” é uma antecipação do envio missionário fora das cidades conhecidas de Cafarnaum e Nazaré.
Pelas suas palavras e atitudes, Jesus está encontrando a incompreensão dos familiares e aparecem verdadeiros adversários que já pensam como matá-lo (Mc 3,6). O medo dos discípulos, então, não é somente o da tempestade; é, antes, o de morrer com Jesus e, sabemos, que esse medo os acompanhará até o final, quando fugirão todos na hora da cruz (Mc 14,30). No entanto Jesus “dorme”, ou seja, parece despreocupado, ausente. Será? Talvez esse era o pensamento das primeiras comunidades quando foi escrito o evangelho de Marcos. Há momentos de provação e dificuldades pessoais e comunitárias, nos quais nós também duvidamos da promessa de Jesus de estar conosco, todos os dias, até o fim dos tempos (Mt 28,20).
Depende de como entendemos a presença de Jesus no meio de nós, presença garantida, também, com o dom do Espírito Santo, porque é aí que nós podemos entender melhor. Com certeza, nós gostaríamos que o Senhor atendesse imediatamente os nossos pedidos e, assim, resolvesse todos os nossos problemas, quem sabe, podendo ser nós a dormir tranquilamente, cobrando tudo dele. Não é bem assim. Desde o início daquela que chamamos “história da salvação”, Deus chamou homens e mulheres para colaborar com ele.
Alguns obedeceram e fizeram coisas prodigiosas, outros menos, outros, infelizmente, desobedeceram. Igualmente fez Jesus quando anunciou a chegada do Reino e, mais ainda, após sua morte e ressurreição. Sempre ele irá se servir da nossa pobre colaboração, sempre saberá chamar e inspirar alguém para ajudar, também se passando por momentos de martírio e de necessária conversão.
Em lugar de cultivar dúvidas, precisamos vencer o medo, crescer na confiança e na certeza de que ele está sempre conosco, sobretudo no sofrimento e nas provações. Devemos colocar na conta do Reino, além do cêntuplo, também violência e perseguições (Mc 10,30). Se a Coragem e a Vontade juntas venceram o Medo, mais ainda, isso acontecerá somando a força e a luz da Fé.